Postado em 26 de junho de 2023 por sn-admin
O crescimento populacional, atrelado à má distribuição de renda e ao descaso com os recursos naturais, integra algumas das premissas nas quais os estudiosos se baseiam para propor soluções denominadas “Cidades do Futuro” . Depois de ultrapassar 8 bilhões de pessoas neste ano, a Organização das Nações Unidas (ONU) estima que a população mundial será de 10 bilhões de habitantes até 2050, tornando a superlotação urbana um dos problemas mais urgentes da atualidade.
Atualmente, 55% da população mundial vive em cidades. As projeções da ONU apontam que esse valor chegará a 70% em cinco décadas. Esta tendência se entrelaça com várias consequências que levam os cidadãos a procurarem melhores oportunidades de trabalho, condições de vida, ambiente multicultural e uma vida mais dinâmica no meio urbano.
No entanto, o grande desafio urbano é assegurar a qualidade de vida de seus habitantes e o crescimento sustentável desses espaços. Neste contexto, há a aposta em projetos que criam as regras das cidades do futuro.
O que são cidades do futuro?
A utilização de dados na urbanização está associada à construção de cidades inteligentes, que são objeto de um grande esforço global para melhorar o funcionamento urbano e são, em parte, uma resposta ao projeto incoerente de infraestrutura e planejamento do passado.
As cidades do futuro prometem monitoramento, análise e melhoria em tempo real dos centros urbanos. Sendo assim, os resultados promovem maior eficiência de serviços públicos, sustentabilidade ambiental, segurança e o engajamento dos cidadãos.
O design centrado no usuário e as metodologias experimentais quantitativas são, atualmente, duas das principais formas pelas quais os profissionais de arquitetura tentam abordar o tema das cidades do futuro. A combinação de ambas as estratégias permite uma visão interdisciplinar capaz de identificar as necessidades mais prementes e, ao mesmo tempo, permite combiná-las com as novas tecnologias e dados disponíveis para projetar um futuro mais responsável e sustentável, tanto no campo do espaço construído e real, quanto no espaço virtual.
As cidades futuristas devem contar com recursos como a Internet das Coisas (ioT, que permite, por exemplo, o uso de semáforos e iluminação inteligente), big data, inteligência artificial, veículos autônomos e muito mais. Desse modo, quando o assunto é uma cidade do futuro, há a abordagem de modelos que podem beneficiar as pessoas e o meio ambiente.
Questões que moldam as cidades inteligentes
O mundo enfrentou uma reviravolta em 2008, quando, pela primeira vez na história, metade da população humana estava localizada em uma área urbana. Na época, aproximadamente 3,4 bilhões de pessoas residiam em cidades, representando 50% da população mundial total.
Como citado, espera-se que o número continue a crescer exponencialmente nas próximas décadas. Dessa forma, surgem uma série de questões e desafios que vão moldar o crescimento e desenvolvimento das cidades do futuro. Confira alguns deles.
Aquecimento global
O aumento da temperatura média global deve ser mantido abaixo de 1,5 graus Celsius. Para tal, até 2030 as emissões de CO2 precisam ter uma redução de 45% em relação aos níveis de 2010.
Há anos cientistas vêm trabalhando em diversas frentes em busca de uma solução para este problema, como diminuir o consumo de matérias-primas, desenvolver sistemas de produção mais eficientes, adoção de combustíveis renováveis, mudanças na mobilidade urbana e a busca de alternativas ao cimento e à areia. Porém, estas ainda não são alternativas boas o suficiente.
É preciso mudar o modo como o ser humano aborda a forma de construir para, assim, tentar se aproximar do conceito de construção neutra em carbono. Isto é, para manter o aquecimento global abaixo de 1,5°C – o que ainda terá consequências devastadoras para o meio ambiente – há um limite para a quantidade de carbono que o mundo pode emitir, como um orçamento fixo de CO² para o mundo. Se a humanidade mantiver as emissões de carbono nos níveis atuais, terá somente 26 anos até esgotar esse “estoque” de CO².
Internet das Coisas
A Quarta Revolução Industrial está se desenrolando rapidamente à medida que as interações humanas se digitalizaram a um compasso exponencial, fazendo com que as pessoas incorporem novas tecnologias em um ritmo cada vez mais rápido. A digitalização da indústria da construção é uma das maiores oportunidades para os empreendedores hoje, atraindo a atenção dos principais urbanistas, arquitetos, inovadores e profissionais da área da construção.
A Internet das Coisas ou Internet of Things (IoT), inteligência artificial, robótica, impressão 3D e realidade virtual são apenas algumas das novas ferramentas que os arquitetos estão adotando atualmente. Trata-se de uma verdadeira mudança de paradigma, que possui um impacto profundo na forma como as cidades do futuro são concebidas, projetadas e construídas.
Isto significa que o papel do arquiteto terá de se transformar, aceitando a sua profissão multidisciplinar e abraçando estas tecnologias para encarar esta nova função ou interface profissional.
Big data
As cidades do futuro são cidades inteligentes, ou seja, estruturas que funcionam como um ecossistema de big data. Todo tipo de interação humana é monitorado em algum lugar e em algum momento. Muitas empresas já estão usando esses dados para desenvolver projetos mais inteligentes e mais responsivos às necessidades humanas.
No entanto, alguns dados relacionados ao uso do espaço urbano merecem maior atenção, como a caminhabilidade, a acessibilidade, as variações de uso durante o dia e a conectividade e integração do tecido urbano como um todo — que, sem dúvida, podem ter muito a ver com o futuro de projetar um espaço urbano mais eficaz, equitativo e sustentável.
Co-working e co-living
A saúde humana e o bem-estar psicológico também são tópicos que podem ser melhorados e otimizados por meio de novas tecnologias e processamento de dados. À medida que a população humana aumenta, torna-se imperativo otimizar a qualidade dos espaços públicos, oferecendo plena coexistência entre diferentes comunidades, a fim de permitir que interajam de forma saudável em espaços urbanos mais acessíveis e diversificados.
As condições de conforto dos ambientes de trabalho e doméstico podem ser controladas por sensores que processam dados de bem-estar do usuário em tempo real, como iluminação natural, circulação de ar e interação humana. No futuro, por exemplo, a maioria dos edifícios deverá ser capaz de detectar a necessidade de ar fresco em um determinado espaço interno e ativar automaticamente os sistemas de ventilação em resposta.
Além disso, o design de interiores também possui uma influência decisiva no conforto e bem-estar físico e psicológico dos ocupantes, que se torna mais importante à medida que os espaços diminuem e ficam sobrecarregados. Dessa forma, o investimento no campo da psicologia ambiental (ou espacial) – que nos permite entender mais profundamente como as cores, os materiais, a espacialidade, as condições de iluminação e até mesmo a decoração afetam o comportamento humano – é cada vez mais urgente e necessário.
Tendências que irão integrar as cidades do futuro
Quando as cidades do futuro entram em pauta, é inevitável não pensar em máquinas e robôs. E sim, a automação está entre as principais características adotadas nesses modelos de centros urbanos e irá ganhar ainda mais espaço no futuro. Para os próximos anos, várias tendências e perspectivas estão traçadas e espera-se que façam parte dos projetos das cidades inteligentes.
Cidade sustentável
A sustentabilidade tornou-se uma pauta constante e muito importante ao longo dos anos. Com isso, muitos mercados já se apropriaram desse interesse comum e criaram produtos e serviços com base em tal conceito. E isso, provavelmente, irá se intensificar no futuro. Muitos projetos residenciais e comerciais já são projetados com materiais sustentáveis, utilizam fontes de energia renováveis e adotam diversas estratégias verdes em sua estrutura. Isso não é apenas uma tendência, mas uma necessidade que vem ganhando cada vez mais espaço e deve ser mais intensa nas cidades do futuro.
Inteligência artificial (IA)
Se antes parecia assunto de filme voltado para a ficção científica, hoje a inteligência artificial já é uma realidade. As principais tendências de aplicativos para as cidades do futuro incluem veículos autônomos, monitoramento de saúde e segurança da informação. Além da comunicação, que propõe uma revolução no contato entre empresas e clientes, um exemplo são os chatbots, que devem se desenvolver ainda mais, e a integração de canaisde atendimento, conhecida como omnichannel.
Mobilidade
Considerando as constantes preocupações ambientais, bem como o número impraticável de veículos nos perímetros urbanos, a cidade do futuro deve se concentrar mais em outros modos de transporte. Os carros serão subutilizados, abrindo espaço para os que são compartilhados, e outras estratégias de planejamento de cidades devem ser pensadas, como bairros com espaços para que as pessoas caminhem mais ou invés de usar meios de transporte convencionais e adoção de ciclovias, entre outras iniciativas.
Mercado de trabalho
Algumas mudanças no mercado de trabalho já estão em andamento e se tornarão ainda mais significativas em um futuro próximo. No momento, um número crescente de startups pode ser visto. As organizações têm cada vez menos funcionários, equipes mais enxutas e multidisciplinares, sendo que muitas eliminam níveis hierárquicos e dependem de outros relacionamentos internos.
No entanto, há mais profissionais autônomos. A modalidade home office já é uma realidade em inúmeras corporações, o que deve ser enfatizado nas cidades do futuro. Além disso, plataformas como crowdfunding serão cada vez mais usadas para criar novos negócios e muitas outras tendências.
Neste sentido, novos mercados e novas maneiras de fechar negócios, além de certas profissões, podem surgir, principalmente aquelas relacionadas à introdução e aprimoramento de novas tecnologias e análise de dados.
Exemplos de cidades do futuro
1. Cidade portuária de Colombo, Sri Lanka
O governo do Sri Lanka está construindo uma cidade portuária na capital, Colombo, para competir com os principais centros econômicos do mundo.
A cidade está estrategicamente localizada para se tornar um dos mais relevantes centros independentes de investimentos. O desenvolvimento, que deve ser concluído em 2041, pode redefinir a posição geopolítica e econômica do Sri Lanka no mundo. Com investimento inicial de US$ 1,4 bilhão, a cidade terá 269 hectares. Vale destacar que ela é cercada pelo Oceano Índico, na linha marítima mais movimentada do mundo.
2. Belmont, Estados Unidos
O empresário de tecnologia e fundador da Microsoft, Bill Gates, está construindo uma cidade do futuro no deserto do Arizona. Belmont cobrirá 25 mil acres de terra e será projetada e construída com tecnologia em seu núcleo.
Os desenvolvedores, Belmont Brothers, apontam que a cidade se concentrará na habitabilidade e oferecerá internet de alta velocidade integrada ao ambiente. Os 182 mil moradores projetados poderão se deslocar pela cidade em carros autônomos, com semáforos inteligentes que reduzem o congestionamento.
3. Cidade da Floresta, China
Localizada na China, a Forest City tem como principal meta tornar-se a primeira cidade totalmente ecológica do mundo. Procura-se combater a poluição do ar absorvendo CO² (cerca de 10 mil toneladas por ano) e produzindo oxigênio (900 toneladas por ano). A cidade chinesa irá apresentar prédios verdes, cobertos de plantas, espalhados em áreas residenciais, comerciais e de lazer.
4. Songdo, Coreia do Sul
Desenvolvido desde 2002, o International Business District (IBD), em Songdo, na Coreia do Sul, visa maximizar a mobilidade usando transporte público e ciclovias. Com 40% da área destinada a espaços verdes, o plano é colocar a maior parte dos escritórios, escolas e edifícios não residenciais junto a prédios de apartamentos, para incentivar a caminhada. Como resultado, as cidades devem reduzir significativamente as emissões de gases de efeito estufa.
5. Putrajaya, na Malásia
Como alternativa à superlotação, Putrajaya, na Malásia, iniciou a construção em 1995, para se transformar o novo centro administrativo do país. O território conta com um plano urbanístico baseado no conceito Smart Garden City, que investe na criação de zonas verdes e no uso de recursos tecnológicos para reduzir a carga sobre o meio ambiente. A cidade tem uma área total de apenas 49 metros quadrados e apenas cerca de 90 mil habitantes, a maioria dos quais são funcionários públicos. Isso ocorre devido a este local abrigar o gabinete do primeiro-ministro e a maioria dos escritórios executivos do país.
Cidades do futuro no Brasil
De acordo com o Ranking Connected Smart Cities 2021, São Paulo é a cidade com maior nível de inteligência e, portanto, está a um passo de estar mais bem preparada para ser a cidade do futuro no Brasil. Consecutivamente, Florianópolis (SC), Curitiba (PR), Brasília (DF) e Vitória (ES). Os critérios de classificação das cidades incluem tecnologia, inovação, mobilidade, governança, proteção ao meio ambiente e recursos naturais, digitalização de servios públicos, entre outros.
Entre os principais pontos fortes que levaram São Paulo a essa posição estão o fato de a cidade ter 99,8% de cobertura 4G (sendo que a cobertura 5G está avançando nas principais regiões). Isso viabiliza soluções como o pagamento em PIX de diversos serviços públicos, permite o agendamento de consultas no sistema de saúde por meio da Internet, já há serviços de prontuário médico online e em tempo real, sem contar a rede de semáforos inteligentes e soluções para a chamada Indústria 4.0.
Benefícios das cidades inteligentes
Uma característica essencial das cidades inteligentes é que elas apresentam eficiência. Ferramentas de tecnologia bem projetadas podem beneficiar a gestão pública, o meio ambiente e a população. As cidades inteligentes podem aprimorar a eficiência dos serviços municipais, eliminando aborrecimentos, encontrando maneiras de economizar dinheiro e simplificando as tarefas dos funcionários.
Porém, uma das maiores vantagens é a melhoria da qualidade de vida dos residentes. As oportunidades cobrem uma ampla gama de questões, incluindo serviços educacionais, condições de saúde e relações com a comunidade. Esforços nesse sentido podem incluir rastreamento e mapeamento rápido e eficaz de doenças, identificação de casos de crime e preconceito, novos modelos educacionais, implantação de veículos autônomos para aumentar a segurança e a mobilidade da população, entre outros.
Cidades do futuro prometem monitoramento, análise e melhoria em tempo real na cidade. Os resultados, dizem os diversos especialistas envolvidos em projetos inteligentes, melhorarão a eficiência, a sustentabilidade ambiental e o engajamento dos cidadãos. Os projetos de cidades inteligentes são os principais investimentos que devem impulsionar a transmutação da sociedade.
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