Postado em 24 de julho de 2023 por sn-admin
Assim como estilistas usam alfinetes, agulhas e tecidos para dar vida às suas criações, arquitetos dependem dos materiais para moldar o ambiente construído. Do aço e vidro à madeira e concreto, esses formam a paleta artística que transforma plantas em estruturas tangíveis, preenchendo a lacuna entre imaginação e realidade. É tão simples e tão complexo quanto isso. Mas, com tantos materiais e inúmeras formas, acabamentos, texturas e cores disponíveis nos dias de hoje, fazer as escolhas corretas para um projeto específico pode ser bastante desafiador. Várias perguntas naturalmente surgem: Como os arquitetos navegam pelas possibilidades infinitas para escolher os elementos que darão vida às suas criações? O que o processo de especificação de materiais envolve? Por onde começar?
A maioria dos profissionais de arquitetura também se dedica pela especificação de materiais, e para tomar decisões informadas, eles devem levar em consideração uma série de fatores – custos, durabilidade, desempenho, estética e qualidade geral. Deixar de fazer isso pode ter consequências desafortunadas, resultando em projetos com problemas tanto funcionais quanto estéticos. Isso é precisamente o que torna a etapa de especificação tão essencial para alcançar os resultados esperados.
Para ajudar arquitetos e designers no processo, aqui fornecemos um guia passo a passo com nove dicas gerais a serem seguidas ao especificar materiais, exemplificadas por uma série de projetos, diagramas e detalhes de construção. Cada ponto é acompanhado de uma ‘Dica Profissional’ que pode ajudar os arquitetos na formulação de uma Ficha de Especificação de Materiais – um documento detalhado que descreve os requisitos, características e diretrizes do projeto, servindo como um guia de referência valioso para profissionais da indústria. Ao aderir a este documento, os arquitetos podem garantir que os materiais selecionados atendem aos padrões de qualidade, desempenho e segurança do projeto (que, é claro, variam em diferentes países e regiões).
1. Entender os requisitos de projeto
Uma compreensão completa das necessidades e requisitos específicos de um projeto – seja relacionado a custos, durabilidade, integridade estrutural, estética ou conformidade regulatória – serve como base para tomar decisões informadas, permitindo que arquitetos selecionem materiais que estejam alinhados com seus objetivos e atendam a restrições específicas. Na casa da Villa Matilde, em São Paulo, por exemplo, restrições orçamentárias motivaram os designers a construir paredes estruturais usando blocos de concreto aparentes. Isso lhes permitiu montar um edifício de alta qualidade, mas de baixo custo e manutenção, de forma rápida e eficiente. Também guiados por razões econômicas, arquitetos no Irã optaram por revestir um edifício residencial em travertino local, disposto em um padrão curvo e fluido para permitir luz e ventilação.
Dica Profissional: Uma Ficha de Especificação deve incorporar uma seção de ‘Preparação’ ou ‘Pré-projeto’ onde é claramente declarado que a construção seguirá os requisitos de qualidade, tipo de materiais, sistemas construtivos e estabilidade estabelecidos nas regulamentações locais atuais, incluindo aquelas especificadas por instituições nacionais e entidades especializadas.
2. Pesquisar e coletar informações
Após avaliar os requisitos do projeto, é crucial a coleta de dados sobre diferentes materiais garante a compatibilidade com essas necessidades. A pesquisa ajuda a avaliar fatores como condições climáticas locais, códigos e regulamentos de construção, além de fornecer informações sobre a disponibilidade dos materiais, qualidades visuais e propriedades funcionais. Esta etapa foi fundamental para o sucesso de um projeto de reforma residencial; ao estudar diferentes iterações, os arquitetos puderam especificar adequadamente os oitenta e sete painéis geométricos de aço inoxidável pretos que envolvem o edifício, respondendo a parâmetros estruturais e climáticos. Da mesma forma, os designers investigaram o comportamento de dispositivos de sombreamento e vidro de alto desempenho, experimentando ângulos e layouts, para criar um arranha-céu climaticamente responsivo em Singapura.
Dica profissional: A empresa de construção deve reunir cuidadosamente informações e revisar as plantas, especificações e o canteiro de obras antes de iniciar o processo de construção, aumentando as consultas necessárias. O arquiteto deve então abordar quaisquer perguntas que possam surgir sobre a interpretação de plantas e especificações.
3. Avaliar o desempenho dos materiais
Muito antes de um edifício ser construído, os arquitetos podem testar e avaliar como certos materiais desempenharão em circunstâncias específicas para otimizar o processo de especificação, especialmente com a quantidade de informações, tecnologia e ferramentas que eles têm à sua disposição. Esse foi o caso da Biblioteca de Hunters Point-onde os arquitetos desenvolveram uma maquete externa de concreto para avaliar o desempenho da fachada -e nesta remodelação de um hotel, onde um protótipo de tijolos foi construído para testar a viabilidade do método de construção e do orçamento, dando confiança para o cliente, operários e designers.
Dica profissional: Na seção “Trabalho preliminar”, especifique que todos os materiais e elementos estruturais devem passar por um número designado de testes de controle de qualidade, realizados por um laboratório autorizado e de acordo com os respectivos padrões regionais.
4. Considerar a estética e os objetivos do projeto
Com opções infinitas de cores, texturas, acabamentos e padrões, bem como diferenças na maneira como envelhecem, respondem à luz e se complementam, os materiais (especialmente quando deixados expostos) darão o tom do espaço no futuro. Portanto, eles podem ser especificados não apenas com base em motivos funcionais, mas também para criar espaços envolventes e visualmente atraentes que materializem as visões criativas dos arquitetos. Os materiais podem ser selecionados por sua textura bruta, peso e opacidade ou mesmo por sua capacidade de oxidar com o tempo, descobrindo nesse processo natural um alto valor estético.
Dica profissional: a seção “Acabamentos” deve conter detalhes precisos sobre os tratamentos de superfície e elementos decorativos aplicados a vários componentes arquitetônicos, fornecendo informações sobre a aparência, textura e cor desejadas. Preste atenção especial ao revestimento interno e externo, piso, janelas, portas, acessórios, tintas e equipamentos.
5. Priorizar a sustentabilidade
A indústria da construção está cada vez mais adotando práticas sustentáveis, com materiais desempenhando um papel vital. Para reduzir o impacto ambiental, arquitetos podem enfatizar materiais renováveis, com baixas emissões de compostos orgânicos voláteis (COV), que sejam de origem local ou eficientes em termos de energia. Por exemplo, a Escola Fass localizada no interior do Senegal é construída com tijolos locais de bambu e adobe que, combinados com estratégias de design passivas, promovem um ambiente de aprendizado sustentável e confortável. Enquanto isso, arquitetos brasileiros especificaram a taipa de pilão como o principal material de construção de uma casa, uma alternativa ecológica conhecida por sua alta massa térmica e economia de energia.
Dica profissional: deve-se enfatizar que a eficiência deve ser abordada em todas as etapas e aspectos de um projeto. Apenas a seleção de materiais sustentáveis é insuficiente se outras áreas promoverem a ineficiência (por exemplo, confiando no transporte de longa distância com uma pegada substancial de carbono).
6. Criar agenda de materiais
Do projeto à construção e manutenção, qualquer projeto de arquitetura depende de vários estágios para se desenrolar, cada um envolvendo diferentes agendas. Gerentes de projeto devem identificar, organizar e categorizar os diferentes materiais necessários para cada etapa de antecedência, que inclui especificar fabricantes, modelos, tamanhos, acabamentos e outros detalhes relevantes. The Natural Pavilion é um excelente exemplo. Feito com módulos compostos por uma estrutura de madeira, aço, materiais biológicos e reutilizados, os arquitetos tiveram que criar cronogramas de materiais abrangentes para garantir a disponibilidade oportuna de cada componente, minimizar atrasos e controlar os custos do projeto, além de facilitar logística e gerenciamento de inventário .
Dica profissional: O documento de especificação deve incluir seções categorizadas com diretrizes e instruções detalhadas, incluindo, entre outros, limpeza do terreno, aterro, layout e nivelamento, escavações e remoção de detritos, trabalho estrutural, concretagem, subsolos, pavimentos, partições, lajes, circulação vertical, acabamentos internos e externos, gerenciamento de água da chuva e equipamentos.
7. Colaborar com especialistas
Arquitetura é um esforço de equipe. Projetos se tornaram mais complexos e multidisciplinares, exigindo uma abordagem holística e um conjunto diversificado de habilidades e conhecimentos. As relações entre profissionais do setor, como engenheiros estruturais e mecânicos, empreiteiros e consultores de sustentabilidade, são uma fonte vital de informação ao especificar materiais, ajudando os projetistas a obterem informações sobre especificações técnicas, regulamentos locais e muito mais. Em um centro comunitário no Camboja, por exemplo, os arquitetos se uniram às mulheres Khmer e engenheiros para testar e desenvolver com êxito a técnica construtiva. Enquanto isso, os arquitetos do Burundi colaboraram com uma ONG local, uma organização sem fins lucrativos belga e estudantes universitários para especificar estratégias materiais para uma biblioteca confortável e de baixo custo.
Dica profissional: indique cedo a frequência com que todos os atores envolvidos em um projeto devem se reunir. Pelo menos uma reunião mensal na obra é geralmente necessária entre o inspetor de edifício, empreiteiro, arquiteto, engenheiro e/ou gerente de construção. Outras reuniões também podem incluir o cliente, quando necessário.
8. Documentar a especificação de materiais
A documentação completa é fundamental ao especificar materiais. Fornece informações precisas sobre os materiais a serem usados, incluindo suas peças, padrões de qualidade, diretrizes de instalação e outras características detalhadas. Essa clareza e consistência ajudam arquitetos, empreiteiros e fornecedores a entender os requisitos exatos, reduzindo as chances de más interpretações ou erros e garantindo a conformidade com os códigos de construção e os padrões do setor. Obviamente, grande parte desse processo de documentação é altamente visual e, portanto, depende principalmente de desenhos precisos em várias escalas, seja um detalhe intrincado ou um diagrama conceitual.
Dica profissional: estabeleça que cada documento será mantido e disponibilizado em um arquivo por toda a duração do projeto. Normalmente supervisionado pelo inspetor de edifícios, o arquivo deve ser composto pelo conjunto completo de planos, especificações técnicas e todos os documentos anexados necessários que permitirão a supervisão administrativa, contábil e técnica eficaz.
9. Implementar um monitoramento e plano de manutenção
Por último, mas certamente não menos importante, os arquitetos podem implementar um plano abrangente de monitoramento e manutenção para garantir que os materiais atendam aos padrões e critérios de desempenho especificados. Isso permite a detecção precoce de quaisquer desvios ou deficiências e, portanto, permite medidas corretivas imediatas. Por exemplo, ao especificar madeira – que é propenso a danos por umidade, pragas e podridão – selagem, pintura e inspeções regulares são essenciais para manter sua condição. Embora relativamente mais fácil de manter, o concreto pode desenvolver rachaduras e descoloração ao longo do tempo, muitas vezes exigindo vedação, remendos e limpezas para manter seu apelo visual e prolongar sua vida útil. Por fim, os materiais devem ser especificados com uma perspectiva de longo prazo, a fim de preservar sua qualidade e longevidade de acordo com a intenção do projeto.
Dica profissional: enfatize que a empresa de construção deve garantir consistentemente a boa qualidade e a execução adequada do trabalho realizado por sua própria equipe e subcontratados. Se for necessário retrabalhar para corrigir componentes mal executados, não será tratado como um custo adicional para o cliente.
Fonte: Archdaily