Postado em 1 de outubro de 2025 por sn-admin
A construção civil está se adaptando a uma nova era, marcada tanto por inovações tecnológicas como o BIM (Building Information Modeling) — que desde 2024 exige mapeamento detalhado em projetos públicos, atuando como uma ferramenta de auditoria em tempo real — quanto pela mais complexa das mudanças: a Reforma Tributária.
O novo modelo fiscal, centrado no Imposto sobre Valor Agregado (IVA), promete um sistema mais transparente, neutro e não cumulativo, mas impõe uma reestruturação profunda em um setor historicamente sensível aos tributos indiretos.
A Virada do IVA: Adeus, Cumulatividade e Distorções
A complexidade do sistema atual — com regimes variados como o RET de 4% para incorporações, mas que ainda sofre com a cumulatividade em indústrias e fábricas — está sendo substituída por um IVA dual, composto pela CBS (federal) e IBS (estadual/municipal).
O grande objetivo é eliminar a chamada “cascata tributária” e as distorções que concentram o peso dos impostos.
As Novas Regras da Lei Complementar 214/2025:
Alíquotas Reduzidas: A alíquota de referência do IVA é de 26,5%, mas para a construção civil, ela é reduzida em 50%, ficando em cerca de 13,25% para alienações e serviços. Operações de locação têm redução de 70% (cerca de 7,95%). Essa redução visa compensar a alta participação da mão de obra (que não gera crédito) e a exigência de capital de giro.
Apuração por Empreendimento: A tributação será detalhada por obra, com a identificação do número da obra na nota fiscal. Isso exige que as empresas mantenham um centro de custo separado para cada empreendimento, permitindo o rastreamento de créditos.
Fato Gerador: Para alienação de imóveis e incorporações, o fato gerador (momento da tributação) é a alienação, locação ou administração. Já para serviços de construção, o fato gerador é o fornecimento.
Geração de Créditos: Regra geral, todos os insumos, materiais e serviços adquiridos para a execução da obra devem gerar créditos financeiros para compensação de débitos futuros, promovendo a não cumulatividade.
Os Desafios dos Materiais e a Transição
A transição para o novo modelo não será simples e já gera controvérsias, especialmente sobre o que pode ou não gerar crédito fiscal:
O “Redutor de Ajuste”: Obras iniciadas antes de 2027 (quando o IVA entra em vigor) usarão um “redutor de ajuste” que incluirá o custo dos materiais antigos. O problema é que esses valores reduzirão a base de cálculo, mas não gerarão novos créditos no IVA. Materiais comprados após 2027, por outro lado, gerarão crédito integral. Isso pode comprometer a neutralidade do sistema para obras em andamento.
Lição do STJ (Regime Atual): O Judiciário já vinha restringindo deduções no ISS. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) recentemente limitou a dedução de materiais àqueles produzidos pelo próprio prestador e fornecidos fora da obra. Materiais comprados de terceiros não são mais dedutíveis da base do ISS, o que aumenta a base de cálculo. Esse precedente antecipa debates similares no novo sistema.
Complexidade Operacional: A apuração por obra e a integração de novos mecanismos como o split payment (pagamento dividido, com retenção direta do tributo), a Declaração de Operações com Regimes Especiais (DERE) e a utilização de novas notas de crédito/débito exigirão investimento maciço em tecnologia, capacitação e reestruturação dos setores fiscal, contábil e financeiro.
O Futuro da Gestão e Contratos
Construtoras e incorporadoras precisam agir rapidamente. A adaptação exige não apenas ajustes contábeis, mas uma revisão jurídico-estratégica completa:
Revisão Contratual: Novos contratos devem prever cláusulas para reajustes paramétricos, alocação de responsabilidade sobre notas de crédito/débito e sincronização entre os marcos de medição da obra e a emissão das notas fiscais.
Eficiência da Cadeia: A reforma incentiva a formalização de toda a cadeia produtiva para que o crédito possa fluir perfeitamente entre todos os elos.
No médio prazo, o sucesso do IVA dependerá de regulamentações detalhadas e da capacidade de harmonização entre os estados e municípios, mas a mudança já é inegável: a construção civil precisará de uma gestão de crédito tributário e de tecnologia muito mais eficiente para prosperar.
Fonte: Conjur